10 novembro 2007

Oceanos alterados

Para começar a falar sobre os mares do planeta, tema da discussão deste mês no roda de ciência, dou a palavra a Kenneth Weiss e Usha McFarling. E arregalo os olhos diante das imagens de Rick Loomis. A aterradora série de reportagens Oceanos alterados, publicada no ano passado pelo Los Angeles Times, valeu à equipe o prestigioso prêmio de jornalismo Pulitzer de 2007. Prêmio para lá de merecido. Dou aqui uma palhinha à guisa de isca. O conjunto é longo mas vale a pena.

Na primeira parte, "Uma maré primordial de toxinas", uma erva-daninha marítima - na verdade uma bactéria - se espalha com velocidade espantosa e se prende às redes dos pescadores. É a erva-de-fogo, e quem se aproxima sente a pele queimar, os olhos incharem, a garganta fechar-se. Terrível para os pescadores na costa da Austrália e também para pesquisadores que tentam descobrir de onde vem tamanha toxicidade e se expõem aos vapores sufocantes. A erva-de-fogo não é novidade, não surgiu do nada. O que espanta é a densidade que atinge - conseqüência do desequilíbrio ecológico que tem origem no uso dos mares pelo homem. E esse não é, nem de longe, o único exemplo.

Leões-marinhos magros, desorientados e com convulsões têm aparecido nos centros de atendimento de mamíferos marinhos na Califórnia. Muitos morrem, apesar dos esforços dos veterinários. "Sentinelas sob ataque" mostra o que acontece com os predadores maiores depois de comer peixes que se alimentaram de algas tóxicas que proliferaram de maneira anormal. E não são só os leões-marinhos que correm perigo. Também somos predadores do topo da cadeia alimentar.

E não adianta virar vegetariano. A maré periodicamente traz à costa da Flórida uma profusão de peixes mortos e algas tóxicas que atacam o sistema respiratório de quem passa por perto. O jeito é tapar o nariz e trancar-se em casa, como mostra "Marés escuras, ventos nefastos". E os sintomas não param em falta de ar, tosse e inchaço nos olhos. Há quem sofra também conseqüências neurológicas, como formigamentos e dificuldade em caminhar. Se continuar assim, os paraísos na Terra deixarão de ser à beira-mar.

E se poluição química assusta, o lixo que bóia não assalta só os olhos sensíveis. Em "Praga de plástico sufoca os mares" aves marinhas morrem vítimas do que achavam ser comida. Plástico não desaparece. Cada saco, brinquedo ou garrafa que conquistou os mares nos últimos 50 anos ainda bóia por aí. Em pedacinhos menores, talvez, mas não menos nocivos. Há quem se dedique a limpar mares e praias. O trabalho de Sísifo, que na mitologia grega rolava uma pedra montanha acima, era moleza.

E ainda contamos com os mares para suavizar os efeitos dos gases estufa que soltamos na atmosfera. O oceano de fato absorve gás carbônico, mas há limites. E conseqüências. Uma é o aumento da acidez da água marinha, que chega a corroer as conchas de moluscos - que têm ali sua única morada. É "Um desequilíbrio químico" que está perto de um ponto de quebra devastador. Não só para o próprio oceano. Quando as águas marinhas chegarem ao ponto de liberar gases em vez de absorvê-los, as mudanças climáticas podem atingir força inesperada.


Este texto é parte da discussão de novembro do roda de ciência.
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