05 novembro 2007

Amazônia globalizada?

Ouvi dizer que a New York Review of Books, que publica boas resenhas que vão além de resenhar livros, está com todo seu conteúdo gratuito na internete. E com ótimos podcasts, também. Mas não cheguei lá. ao entrar na página deles, dei de cara com a foto ao lado. Trata-se de uma queimada perto de Imperatriz, na Amazônia, para substituir floresta por pastos.

A resenha, por John Terborgh, analisa o livro The Last Forest: The Amazon in the Age of Globalization, de Mark London e Brian Kelly. Para Terborgh, o livro peca por ser superficial - apesar de terem percorrido a Amazônia brasileira para entrevistar caboclos, parece que nenhum dos autores fala português. Não sei como eles fizeram, nem até que ponto essa limitação os impediu de enxergar o que viram.

O resenhista não deve conhecer o Brasil. Descreve o Cerrado como uma campina, em vez de dizer que é uma savana. Mas não impede que diga coisas interessantes. Ele rememora uma vez em que sobrevoou a floresta amazônica, a caminho entre o Peru e Miami. Descreve a massa verde até onde os olhos alcançam, interrompida de repente por uma pista de pouso. Não há transição entre o concreto e a floresta, como se vê noutras paragens.


Não há negociação, portanto, entre urbe e selva. As plantações de soja em zona de Cerrado mostram que basta um pouco de tecnologia para tornar produtiva uma área silvestre. Segundo o livro, a primeira ameaça a segunda com o projeto Avança Brasil. "Se o Avança Brasil for adiante como planejado, ele transformará a região amazônica. Trechos de terra da rodovia Transamazônica serão asfaltados, rios serão dragados e ganharão comportas para permitir o tráfego de balsas, novos portos serão construídos e represas serão construídas para fornecer energia hidrelétrica para novas cidades e indústrias. Melhor acesso proporcionado por estradas precipitarão um frenesi de desmatamento e especulação. A indústria madeireria, agora concentrada ao longo das bordas leste e sul da Amazônia, avançarão para as porções central e ocidental da bacia."

Quem diz isso é Terborgh. Avança Brasil não aparece no livro, que se limita a dizer vagamente que o desenvolvimento é inevitável na Amazônia. O resenhista concorda que é impossível manter a floresta como ela é, mas defende que ela não será perdida graças às áreas de proteção que existem - que pode chegar, calcula, a 50% da área amazônica. Mas o equilíbrio ali é delicado: pesquisas indicam que o desmatamento causará secas que se estenderão para oeste e o Cerrado entrará Amazônia adentro.

Muito se estuda sobre a Amazônia seu valor não só em biodiversidade mas como moderadora do clima global. The Last Forest, parece, não é uma referência essencial. Não vou poder agora ir atrás de mais, deixo aqui a isca. Quem encara inglês, vale a pena ler a resenha que é bastante longa.

3 comentários:

João Carlos disse...

Olha só, Maria!... Eu li a resenha e ela não me pareceu mais informativa do que seu artigo. Mas uma coisa me parece que não muda nunca: gringo está sempre "de botuca" na Amazônia.

Na época da ditadura militar, foi necessário mandar tropas e mais tropas, construir estradas que ligam nada a lugar nenhum, e montar a farsa das "agrovilas" em uma terra que se sabia que não prestava para agricultura, tamanha era a infiltração de pseudo-missionários, pseudo-pesquisadores e pseudo-isso-e-aquilo que andavam por lá, já com a idéia de fazer com a Amazônia o que eles fizeram com suas próprias florestas nativas.

Agora, o pretexto é outro: usar o "pulmão do mundo" para contrabalançar a poluição emitida pelos "ecolôs", cujos computadores são alimentados por eletricidade gerada a carvão... Mudou a motivação; continua a cara-de-pau...

Enquanto isso, o IBAMA continua o mesmo... o "oniausente superburocrata" que não fiscaliza chongas e só serve para empacar projetos úteis e comercializar, "por debaixo dos panos", "Licenças" que são uma afronta ao QI de uma samambaia de plástico.

Maria Guimarães disse...

salve, joão carlos! concordo. li a resenha e fiquei com vontade de lançar o assunto por aqui. para conseguir acrescentar algo com ela eu teria que sair procurando informação noutros cantos. sem tempo, ficou mais como provocação. e quem sabe chamariz para conversas e referências mais esclarecedoras.
fiquei pensando na resenha - e no livro que ela deixa entrever. também me chama a atenção essa prepotência em entender a amazônia quando percebe-se no texto como o conhecimento é pra lá de superficial.

João Carlos disse...

Bem, Maria... Considerando-se que a metade mais instruída dos americanos sabe que a capital do Brasil é Buenos Aires (o restante nem sabe o que fica "south of Rio Grande"...) é evidente que se trata de mais uma obra "perpetrada" do que realmente escrita.

Você mencionou as dificuldades de comunicação que os autores devem ter tido para entrevistar os amazônicos. Eu já afirmo que os únicos habitantes da Amazônia que eles entrevistaram foram os já citados missionários. Se o tal livreco tivesse alguma real base acadêmica, pode estar certa de que teria aparecido alguma notícia sobre ele na Nature ou outro periódico de prestígio científico.