01 agosto 2008

Pelos bares da Malásia

Com esses olhos alertas, as tupaias da Malásia, da espécie Ptilocercus lowii (foto ao lado, de Annette Zitzmann - co-autora do trabalho), enganam. Não só são notívagas, como beberronas. Passam em média 138 minutos por noite lambendo as flores da palmeira Eigeissona tristis. O sistema de produção de néctar e pólen dessas plantas é peculiar - o néctar abundante passa um bom tempo fermentando e chega a um teor alcóolico de 3,8% - o mais alto já encontrado na natureza, semelhante a algumas cervejas. Em entrevista para o podcast "Science in action", da BBC, o coordenador da pesquisa Frank Wiens, da universidade alemã de Bayreuth, disse que a quantidade de néctar que as tupaias consomem é como se uma pessoa tomasse 8 taças de vinho por noite!

Apesar de consumirem uma grande quantidade de álcool para suas 50 gramas de corpo, as tupaias não saem trocando pernas (veja
vídeo). E não são as únicas. O grupo de pesquisadores sentiu o cheiro familiar de uma cervejaria perto da planta e observou ao todo sete espécies de mamíferos que se refestelam com o festim etílico da palmeira - mas poucos tão boêmios quanto a tupaia. Outra espécie que se destaca é o lóris-lento (Nycticebus coucang, foto abaixo, daqui), que restringe suas noitadas no bar a 86 minutos em média. Talvez a lentidão que lhe dá nome seja cautela, para não dar bandeira (vídeo aqui). O artigo foi publicado na semana passada na revista PNAS, da Academia de Ciências dos Estados Unidos.

O assunto andou nas notícias e não me chamou a atenção só pela simpatia de bichos bebuns em tempos de lei seca. Também deixou de cabelos em pé esta que já foi estudiosa de mamíferos e mantém a preferência. As tupaias, também conhecidas como musaranhos-arborícolas, apareceram pela mídia como roedores. Não posso me furtar ao protesto: estão muito longe de roedores!

Para não deixar dúvidas, ponho aqui uma
filogenia dos mamíferos, abaixo (do Tree of Life) - observe como uma árvore genealógica. As tupaias, que aparecem como "Scandentia", são na verdade mais aparentadas aos primatas do que aos roedores ("Rodentia"). Os lórises são prossímios, incluídos no ramo dos primatas junto com os lêmures. A confusão não vem só da nossa ignorância dessa fauna do sul e sudeste da Ásia: na Malásia, a palavra tupai indica tanto esquilos (esses sim roedores) como tupaias. Outra confusão surge do termo "musaranho-arborícola". Musaranhos propriamente ditos também não têm muito a ver com as tupaias (aparecem como "Insectivora" na árvore).



É exatamemente por serem quase primatas que o alcoolismo das tupaias é interessante. O próximo passo é entender em detalhes o que na fisiologia delas - e dos lórises lhes permite ingerir tanto álcool sem sofrer as conseqüências motoras - sem falar em ressacas. O interesse maior dos pesquisadores é mesmo compreender a evolução desse aspecto da fisiologia, e porque nós ficamos alegres com uma fração do álcool que as tupaias encaram sem achar que é mais do que uma refeição. Mas pode até, quem sabe, vir a ser útil para tratar dependência alcóolica.

6 comentários:

Anónimo disse...

Boa Tarde,

Acabei de criar um novo o site, o "escritores de blogues" (para visualizar o site basta clickar no meu nome). Este site é uma rede social destinada a todos os escritores de blogues que o fazem em português. O objectivo é criar um espaço comum a todos para que seja facilitado o contacto e a visibilidade de novos projectos independentemente da ferramenta (blogspot, sapo, wordpress) que utilizam.

Neste sentido gostava de o convidar, e a todos os escritores de blogues que estiverem interessados. Para tal basta seguir o link e carregar onde diz "Join this network".

Muito obrigado pela atenção,

Melhores Cumprimentos,

Stran

João Carlos disse...

Ou servir de antídoto ao "bafômetro" dos DETRANs... :D (lembra da minha arenga acerca da diferença do metabolismo dos obesos?... vai, mais ou menos, por aí... um ser humano que ingerisse a mesma quantidade de álcool etílico (por peso) que uma tupaia, entraria em coma).

(A diferença ente nós é que você é uma cientista que quer buscar curas e nos tornar virtuosos... eu sou um religioso que quer um sacerdote que me dê absolvição dos pecados :D )

Maria Guimarães disse...

mas se as pessoas tomarem um remédio que elimine os efeitos do álcool, pra que beber?

João Carlos disse...

E quem falou em eliminar imediatamente os efeitos do álcool?... só na hora de pegar no volante... :D

Anónimo disse...

Eu li mesmo matérias afirmando que esses animais eram roedores... Eles devem precisar do álcool para alguma necessidade específica do organismo. Beeeem curiosa a notícia!

Maria Guimarães disse...

isis, eu chutaria pelo mais simples: eles precisam é das calorias que estão no álcool, como você bem nota no "xis xis". o néctar fermentado é uma fonte de energia eficiente e que eles obtêm sem muita competição, já que são poucos os bichos que dão conta de neutralizar o efeito da bebedeira.