UE com gripe?
Portugal talvez seja o país menos bem preparado da Europa para enfrentar uma eventual pandemia de gripe das aves, de acordo com o estudo divulgado pela revista britânica The Lancet. Reproduzo abaixo texto da notícia da agência Lusa.
As autoridades de saúde lusitanas alegam que o estudo está desfasado e que estamos preparados. E para a Copa, também!?
Não me admiraria que as duas afirmações fossem verdadeiras, pois o estudo data de Novembro de 2005. Acontece que apenas no Outono de 2005 a gripe das aves se tornou verdadeiramente um assunto europeu, com a deteção do vírus H5N1 em aves da Turquia e Roménia. Desde então, foram registados casos de gripe das aves em quase todos os países europeus com exceção de Espanha e Portugal. Seria natural então que muitos países tivessem tomado medidas preventivas de acordo com a sensação de perigo iminente, que teria sido superior na Europa Central e do Norte. Seria interessante se os Pirenéus continuassem a exercer os seus efeitos de barreira biogeográfica!? Por outro lado, na Ibéria peninsular, Portugal foi sempre o país mais periférico (na verdade, de toda Europa continental), a nível político, geo-estratégico, económico e cultural. Lembremos, a vocação atlântica, os Descobrimentos, a anglofilia... Isto explicaria as diferenças com relação a Espanha, no estudo d'A Lanceta. Existirão porventura explicações mais próximas no tempo, e menos psicanalíticas, como riqueza nacional e qualidade do seu serviço nacional de saúde. Mas não estraguemos a minha diversão!
Consultando o Dossier Gripe das Aves do jornal Público, constato que a percepção de risco em Portugal aumentará gradualmente até ao Outono de 2006, altura do ano em que aves migradoras imigram do Norte da Europa, procurando abrigos de invernação mais meridionais (inteligentemente, esperam que as hordas de turistas regressem para norte...). E as autoridades portuguesas parecem ter acelerado o anúncio de medidas preventivas nos meses de Janeiro, Fevereiro e Março de 2006. Ainda bem!
É então aceitável, que Portugal estivesse menos bem preparado que outros países europeus em Novembro de 2005? Sim e não! Sim, por causa da tal diferença de percepção do perigo iminente, que tentei justificar acima. Não, porque a condição de país periférico, que no passado se salvou das desvantagens (glaciações do Quaternário, desenvolvimento, guerras mundiais) e das vantagens (glaciações do Quaternário, desenvolvimento, guerras mundiais, ah ah!) do centro da civilização europeia, não nos salvaria da aleatoriedade do acaso, da excepção à regra, de processos evolutivos não determinísticos. Afinal, qual a chance de o vírus H5N1 entrar em Portugal à boleia de uma ave, se hospedar num lusitano legítimo e, finalmente, se propagar entre lusitanos! Talvez ínfima, mas...!? Se acontecesse, seria mais uma criação lusitana para o Mundo.
Tenho uma certa vontade de iniciar uma digressão sobre como este atraso na reação ao perigo iminente da gripe das aves é um epifenómeno de uma certa estratégia empírico-determinista de sobrevivência, usada por organismos que têm de fazer opções. Não o vou fazer, fica para mais tarde.
Politicamente mais preocupante, para a União Europeia, é a constatação de que poucos países incluíram nos planos a necessidade de colaboração com outros países, apesar de este ser um "imperativo" na luta contra a doença. Mas então para que queremos a UE senão para promover a colaboração dos povos para lá da economia de escala e da geo-estratégica global? Espero que desde Novembro de 2005, também esta realidade se tenha alterado. A bem de um projeto europeu ainda mais integrativo, em que acredito apesar da (e sobretudo pela...) minha identidade nacional periférica.
Gripe das aves: Portugal é o país menos bem preparado da Europa
Lusa, Agência de Notícias de Portugal S.A.
Portugal é o país menos bem preparado para enfrentar uma eventual pandemia de gripe das aves entre os 21 países europeus com planos nacionais de prevenção, segundo um estudo publicado hoje pela revista científica The Lancet. O documento, intitulado "De que forma está preparada a Europa para uma pandemia de gripe? - Análise dos planos nacionais", foi realizado pelos cientistas Sandra Mounier-Jack e Richard J. Coker, do departamento de Saúde Pública da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, com base nos dados disponíveis em Novembro de 2005, com base nos planos nacionais de luta contra uma possível pandemia.
Em declarações ao jornal Público, a 14 de Abril, a propósito deste estudo, a sub-directora-geral da Saúde Graça Freitas afirmou que os investigadores analisaram apenas o plano estratégico publicado, que inclui orientações genéricas . "O estudo está desfasado. Garanto que estamos preparados", afiançou a responsável, citada pelo jornal.
Na classificação da preparação dos países para a eventual chegada da doença entre os humanos, Portugal ocupa o último lugar do grupo dos menos preparados, seguido da Polónia, Roménia, Lituânia, Letónia, Itália e República Checa, que obtiveram uma classificação de cerca de 38 por cento, menos 20 pontos percentuais que a média. O grupo dos mais bem preparados, com uma classificação de 70 por cento, é liderado pela França, seguida da Alemanha, Irlanda, Holanda, Suécia, Suíça e Reino Unido. O grupo intermédio das três categorias de países é constituído, por ordem decrescente, pela Áustria, Dinamarca, Estónia, Grécia, Noruega, Eslováquia e Espanha e obteve uma classificação de 53 por cento.
Nos vários critérios analisados, Portugal ocupa o último lugar no que respeita ao planeamento e coordenação, intervenção da saúde pública, na resposta dos serviços de saúde e nos serviços essenciais necessários e o penúltimo na vigilância e na capacidade de colocar o plano em acção, ficando em todos abaixo dos cerca de 41 por cento. Melhor classificação foi obtida na comunicação - cerca de 60 por cento -, a única área temática que coloca o país no grupo intermédio.
O estudo, publicado na versão "on-line" da revista britânica, realça também o facto de 20 dos 21 países analisados terem desenvolvido uma estratégia anti-viral (com diferentes níveis de detalhes), bem como uma estratégia de imunização para uma vacina, sendo que Portugal foi o único país a deixar o desenvolvimento de uma estratégia nestes campos para "uma fase posterior". E constata que 13 países elaboraram guias para o uso de drogas anti-virais e 14 pretendem imunizar toda a sua população se o "stock" de vacinas for suficiente.
Em termos gerais, o estudo conclui que, embora a preparação em termos de vigilância, planeamento, coordenação e comunicação seja "boa", a manutenção dos serviços essenciais, a capacidade de pôr os planos em acção e as intervenções da saúde pública são "provavelmente inadequadas". Segundo os cientistas, poucos países incluíram nos planos a necessidade de colaboração com outros países, apesar de este ser um "imperativo" na luta contra a doença. Nas conclusões, referem que "o compromisso dos governos na maioria dos países europeus é forte e o nível de preparação é em geral bom". No entanto, "as lacunas na prevenção mantêm-se e existem variações substanciais entre os países, com implicações importante para os mesmos". Por isso, aconselham uma melhoria na cooperação entre os países, através da partilha de experiência, de forma a "assegurar a coerência" dos planos.
O estudo abrangeu os países da União Europeia, os candidatos Bulgária e Roménia e a Suíça e Noruega, tendo eleito 21 planos nacionais para avaliação de acordo com os critérios da Organização Mundial de Saúde (OMS), representando 93 por cento da população. Todos os planos foram elaborados numa estimativa de mortes devido à gripe das aves entre 230 e 465 pessoas por 100 mil habitantes.
O vírus da gripe das aves infectou 196 pessoas desde 2003, tendo matado 110.
3 comentários:
João,
Supondo uma mutação no virus tal que ele comece a propagar de humano para humano, e levando em conta a sazonalidade, onde a pandemia atingiria primeiro? Brasil ou Portugal?
Tudo dependerá da evolução da pandemia nas aves e nas rotas de migração/transporte de aves infetadas. Neste momento, e pelo que conehço, o virus H5N1 foi detetado na Ásia, Africa e Europa. Penso que Portugal estará sujeito a risco iminente no Outono quando aves do norte migrarem para sul. No Brasil, não tenho conhecimento de rotas de migração de aves nem vejo o assunto a ser discutido. Deve ser o tal grau diferencial de percepção deterministica do perigo iminente. Mas nunca se sabe!
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