11 agosto 2007

O pensamento, um sextante

Banner do blogue da Escola da Ponte


A edição de junho da revista piauí trouxe um belo texto do Tom Zé que me remeteu à discussão de julho do roda de ciência: ensino básico, curiosidade e criatividade. Tom Zé conta suas experiências infantis de aprendizado: “Mais prazer tive ao aprender a amarrar o sapato. Amarrar sapato é uma coisa complicada, mas você pode se aproximar dela lentamente. Uma hora você vê o laço dado, outra hora alguém lhe dá uma primeira lição, ou seja, a primeira dobra do laço. Noutro dia você é capaz de pensar na segunda lição. A vantagem é que você sempre pode ver o sapato amarrado por alguém, para você comparar. E foi aprendendo essas coisinhas que percebi que o ato de pensar seria uma maneira de eu me mover dentro do mundo. Um sextante.”

É isso que falta. Aproveitar a curiosidade que toda criança tem e canalizá-la para um aprendizado mais amplo que transcenda o cotidiano. A discussão no roda
aqueceu alguns ânimos, mas não saiu do tradicional. Fui então procurar entender porque a experiência portuguesa da Escola da Ponte não se dissemina. Adianto desde já que não achei a resposta e torço para que entendidos passem por aqui com suas valiosas experiências.

A Escola da Ponte fica em Vila das Aves, no norte de Portugal (veja também na wikipedia), onde funciona desde 1976 – lá se vão trinta anos. Não há salas de aula separadas, há espaços comuns de aprendizado. Não há professores, ninguém que se apresente diante do grupo como portador único da sabedoria. As 220 crianças que ali estudam desenvolvem seus projetos de forma independente e solidária, e têm acesso indiscriminado aos 39 orientadores educativos. No início as crianças aprendem a trabalhar juntas, a gerir seu tempo e avaliar o que sabem. Aliás, a avaliação é assim: quando uma criança julga que sabe o assunto, põe seu nome na lista “Eu já sei” e um professor (ops, orientador) mais entendido avaliará o aprendizado da forma que julgar mais adequada. Por aí vai.

Mas o Brasil é o Haiti e é a Suécia, já disse o João Carlos. Como pensar em projetos de ensino que atravessem os abismos que separam regiões e classes sociais neste país? Eu não sei, mas aposto como o José Pacheco, fundador da Escola da Ponte, tem uma resposta. Para começar, um dos princípios básicos de seu projeto educacional é que cada criança é diferente das outras. Com potencial e dificuldades únicas. Daí o tratamento individual que cada estudante recebe dos orientadores educativos.


E mais, o Brasil não está parado. “Está a acontecer uma reforma silenciosa no Brasil, que tem um potencial humano tremendo e por isso é que venho viver no Brasil, para me afastar da Escola da Ponte e para participar desta transformação das escolas que, discretamente, clandestinamente, vem ocorrendo”, disse Pacheco numa entrevista. Por enquanto só há um exemplo notório: a Escola Municipal Desembargador Amorim Lima, no bairro paulistano do Butantã, que em 2004 começou a derrubar as paredes que dividiam salas de aula. Desejo longa vida à escola, e que a idéia pegue.

(Leia mais sobre a escola Amorim Lima aqui e aqui)


Este texto é parte de uma discussão no blogue roda de ciência.

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