A Herança de Eça
Por Henrique Guimarães
Dia desses, fui ao cinema assistir ao “Primo Basílio”, de Daniel Filho. O filme até que é bom, principalmente se comparado aos últimos filmes a que assisti do diretor, além do que as atuações de Débora Falabella e Glória Pires, como a dupla antagonista feminina, é brilhante. Porém, apesar de muito elogiada, a transposição do romance de Eça de Queirós, da Lisboa do século XIX, para a São Paulo do fim dos anos 50, tira do filme uma das melhores características da literatura queirosiana: o mergulho crítico na sociedade lisboeta do século retrasado.
O público de 300.000 espectadores em duas semanas, obviamente garantido pelo elenco global, já garante a “O Primo Basílio” uma das melhores bilheterias do ano. Mas, ao mesmo tempo, não é nem um pouco garantido que haja um aumento na leitura dessas obras que põem em questão a família, a religião e os bons costumes, com a categoria desse mestre, que era Eça de Queirós.
Eça de Queirós é, junto com Machado de Assis, no Brasil, um dos mais brilhantes e geniais herdeiros da herança realista deixada por Flaubert, em língua portuguesa. Junto com outros portugueses muito conhecidos no Brasil, como Luís de Camões, Fernando Pessoa e José Saramago, Eça nos orgulha de sermos lusófonos, principalmente por sua literatura crítica, densa e possuidora de um ritmo muito característico.
“O Primo Basílio” não é a primeira experiência brasileira de adaptação da obra de Eça. Em 1988, a mesma obra foi adaptada para televisão, assim como em 2001 “Os Maias” que, pelo sucesso, merece uma análise mais profunda.
A série “Os Maias”, adaptada por Maria Adelaide Amaral e dirigida por Luiz Fernando Carvalho é uma, rara, tentativa bem-sucedida de adaptação do maior romance de Eça para televisão, que incluía também o enredo de outro romance do autor, “A Relíquia”. Muito bem dirigida, “Os Maias” também contou com excelentes atuações, destacando-se Walmor Chagas, como o patriarca da família Maia, Fábio Assunção – de atuação irregular na recente adaptação de “O Primo Basílio”, como o próprio – nesse caso como o protagonista Carlos Eduardo, e, por fim, Selton Mello, como João da Ega, o auter-ego de Eça. Com certeza, quem leu o livro, se identificou com a belíssima representação da Lisboa do século XIX, e mesmo aqueles que disseram sentir falta do Embaixador Steinbroken, ficaram estarrecidos com Dâmaso Salcede, na pele de Otávio Müller.
Portanto, para quem teve o prazer de ler os romances de Eça de Queirós, pode analisar as adaptações citadas, no caso de “Os Maias”, disponível em dvd. Para quem nunca leu Eça, está perdendo tempo, seja para mergulhar num mundo distinto do atual, ou para se surpreender com a pertinência de algumas críticas de Eça àquele período, que se encaixam perfeitamente nos dias de hoje.
3 comentários:
henrique, tenho andado querendo ler machado de assis. mas agora você me deu vontade de ir procurar o meu primo basílio, já lido há tantos anos... espero que surja na arrumação de livros que estou começando.
quero crer que algumas pessoas que nunca leram eça de queirós vão se inspirar pelo filme e ir atrás do livro. não muitas, mas é um começo.
deficiências à parte, me diz: o filme vale ser visto, na sua opinião?
Faço minhas as palavras da Maria.
Maria,
Acho que vale a pena sim, principalmente para você formar a sua própria opinião sobre a adaptação, até porque o filme conta com algumas boas atuações. Utiliza um momento importante da história do Brasil para contar uma das mais famosas histórias do realismo europeu...
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