“Declaração de São Paulo” define metas para melhorar a qualidade do ar e dos transportes urbanos na América Latina
Boa parte da poluição do ar é causada por carros particulares. As conseqüências são sérias e vão desde mudanças climáticas globais até mortes e internações. “Existem os conhecimentos, existem opções. É preciso ações conjuntas”, disse Sérgio Sánchez, da Iniciativa do Ar Limpo para as Cidades da América Latina (IAL-CAL) a respeito de melhorar a qualidade do ar e atingir sustentabilidade no transporte. Foi em busca disso que pesquisadores, políticos e técnicos de vários países se reuniram em São Paulo esta semana na conferência “Ar Limpo para a América Latina 2006”.
A poluição traz problemas ao nível local — a poluição do ar; e global — o impacto do homem na atmosfera. “A atmosfera em relação ao mundo é como a casca de uma maçã, uma camada muito frágil”, explicou Mário Molina, mexicano que ganhou o prêmio Nobel de Química em 1995 por descobertas quanto a gases que atacam a camada de ozônio. Como conseqüência das atividades humanas o clima está mudando, o nível do mar está subindo, as chuvas estão diferentes. O impacto que isso causa afeta as florestas, a agricultura, a saúde, os recursos hídricos, entre outros. Segundo ele, restringir as emissões pode ter um efeito importante.
Grande parte da poluição do ar se deve ao crescimento da frota de veículos. Diversos estudos acusam efeitos muito graves da poluição na saúde, como mostrou Bob O’Keefe, do Health Effects Institute, instituição norte-americana que pesquisa efeitos da poluição na saúde. Esses danos incluem problemas cardiopulmonares, ataques cardíacos e inflamações pulmonares, que reduzem de forma importante a duração e a qualidade da vida. Segundo o pesquisador os conhecimentos epidemiológicos nessa área são grandes, e permitem determinar restrições mais rígidas, como tem acontecido nos Estados Unidos.
É preciso limpar os veículos
Os problemas que existem hoje não surgiram por acaso, disse Lee Schipper, da Embarq, instituto sediado nos Estados Unidos que presta consultorias para encontrar soluções de transporte urbano. Eles foram permitidos e até mesmo encorajados, devido a interesses comerciais e políticos, além de maus parâmetros ambientais. A proliferação de pequenos coletivos como as peruas são um problema sério, pois acabam por dividir o trânsito (e a emissão de poluentes) em veículos menores e mais “sujos”. A primeira medida, portanto, é limpar os veículos — tanto em termos de regulagem e tecnologia como do combustível utilizado.
Na maior parte dos Estados Unidos reina o transporte individual. Por isso, a visão norte-americana para melhorar os efeitos deletérios da poluição por veículos reside na tecnologia, no uso de combustíveis não derivados do petróleo e no estabelecimento de normas restritivas a emissões. Foi esse o teor da fala de Alan Lloyd, da Agência de Proteção ao Meio Ambiente da Califórnia. Idéias de desenvolver transporte coletivo existem, mas com menos ênfase.
Luis Cifuentes, da Pontifícia Universidad Católica do Chile, mostrou a experiência chilena em Santiago, onde a renovação da frota de ônibus e táxis teve grande impacto em reduzir as emissões de gases tóxicos. Mas ônibus movidos a combustíveis mais limpos, como gás natural ou biodiesel, não resolvem o problema de poluição se estão presos no trânsito, afirma Schipper. “A mobilidade sustentável é o que resolve o problema”. Segundo ele, a ênfase em combustíveis limpos traz o problema de aumentar sua demanda. A solução é reduzir a necessidade de combustível, explicou. Ruy de Góes, do Ministério do Meio Ambiente, argumentou que a longo prazo é importante reformular o transporte público. Mas a curtíssimo prazo é urgente atender à questão de saúde pública. Para isto, alternativas mais limpas como gás natural e biocombustíveis são necessárias.
Prioridade ao transporte público
Mas combustíveis limpos são uma pequena parte do pacote total, afirmou Lloyd Wright, da Fundação Viva, em Quito (Equador). “A sustentabilidade completa está longe de ser encontrada em um laboratório ou veículo ‘flex’”, alertou. Ele acredita que vias para pedestres, ciclovias e transporte público são soluções muito mais efetivas do que depender de um tipo de combustível. Mas ele avisa que essas soluções só serão adotadas pelo público se oferecerem velocidade, comodidade e segurança.
Em termos de transporte público, metrô pode ser preferível mas inviável. Experiências de sucesso, como Curitiba, Bogotá e Cidade do México, mostram que corredores rápidos de ônibus podem ser soluções eficientes e muito mais baratas do que o metrô. Um projeto em análise em Curitiba é o metrô cutting cover, explicou o Diretor de Negócios da Urbanização de Curitiba S.A. (Urbs) Clodualdo Pinheiro Júnior. É uma tecnologia mais barata do que o metrô convencional, porque as escavações se limitam a 7 metros de profundidade. Em cima dessa vala é posta uma tampa, sobre a qual se propõe a instalação de jardins e ciclovias.
Mas para realmente solucionar o problema, é preciso ousar. Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, contou sobre as mudanças feitas na capital colombiana. Segundo ele, a questão do transporte transcende questões científicas e técnicas. “As cidades têm que refletir que os seres humanos são sagrados”, diz. Elas têm que ser planejadas para promover igualdade social e bem-estar. Até agora foi dada prioridade à mobilidade dos carros mais do que à felicidade das crianças. E segundo ele, para sermos felizes precisamos caminhar. De outra forma sobrevivemos, como um passarinho sobrevive numa gaiola.
Peñalosa chega a considerações mais filosóficas do que políticas. Segundo ele, precisamos rever nossos ideais de felicidade. Talvez ter um carro possante e andar a 200 Km/h numa auto-estrada não traga tanta felicidade quanto passear numa bicicleta velha por uma ciclovia às margens de um rio. Acima de tudo, ele defende que as cidades devem contribuir para a igualdade de qualidade de vida entre as pessoas. Para o ex-prefeito, é impossível tomar decisões sobre transporte sem definir que tipo de cidade se quer. Sua proposta é construir cidades para as pessoas, que privilegiem o espaço público para pedestres.
É esse o rumo que ele tomou durante sua gestão de Bogotá: tornar a cidade mais agradável para pessoas do que para carros. Por isso, vagas para estacionamento perderam espaço para calçadas alargadas. Se os recursos são escassos, a prioridade vai para calçamento de vias para pedestres e bicicletas; se falta espaço, o que não cabe são os carros. É esta a visão de Peñalosa. E andar de bicicleta, não porque seja simpático ou divertido. Mas porque é um direito do cidadão deslocar-se de forma barata sem correr risco de vida.
Tais decisões exigem não só vontade, mas punho político. Porque as medidas para estimular o uso de transporte público não são necessariamente populares — como foi o caso do rodízio de carros na cidade de São Paulo, como lembrou o autor da medida Fábio Feldmann, atualmente Secretário Executivo do Fórum Paulista de Mudanças Climáticas. Peñalosa explica que em cidades onde os cidadãos utilizam transportes públicos, eles não o fazem por amor ao meio ambiente — mas porque há restrições sérias ao uso de veículos particulares.
Esforço conjunto
A conjunção de diversos setores propiciou uma possibilidade de estabelecer colaborações reais. Sigfried Rupprecht, da Iniciativa Civitas da Europa, se declarou aberto para troca internacional de lições práticas. Tanto a Europa como a América Latina têm experiências de sucesso que podem ser bem utilizadas em outros continentes.
O grande problema em São Paulo, segundo o Secretário Municipal de Transportes, é a fiscalização. “Planos temos, mas a realidade nos passa por cima”, lamentou.Vontade política foi a necessidade mais invocada pelos palestrantes da conferência. John Gummer, Secretário do Meio Ambiente do governo de Londres, afirmou: “É possível mudar a vida de uma cidade. Muitas pessoas devem suas vidas a políticas de qualidade do ar. Demos ouvidos por tempo demais àqueles que pensavam que seria difícil demais fazer algo. Poderíamos ter salvo muito mais vidas”.
A poluição traz problemas ao nível local — a poluição do ar; e global — o impacto do homem na atmosfera. “A atmosfera em relação ao mundo é como a casca de uma maçã, uma camada muito frágil”, explicou Mário Molina, mexicano que ganhou o prêmio Nobel de Química em 1995 por descobertas quanto a gases que atacam a camada de ozônio. Como conseqüência das atividades humanas o clima está mudando, o nível do mar está subindo, as chuvas estão diferentes. O impacto que isso causa afeta as florestas, a agricultura, a saúde, os recursos hídricos, entre outros. Segundo ele, restringir as emissões pode ter um efeito importante.
Grande parte da poluição do ar se deve ao crescimento da frota de veículos. Diversos estudos acusam efeitos muito graves da poluição na saúde, como mostrou Bob O’Keefe, do Health Effects Institute, instituição norte-americana que pesquisa efeitos da poluição na saúde. Esses danos incluem problemas cardiopulmonares, ataques cardíacos e inflamações pulmonares, que reduzem de forma importante a duração e a qualidade da vida. Segundo o pesquisador os conhecimentos epidemiológicos nessa área são grandes, e permitem determinar restrições mais rígidas, como tem acontecido nos Estados Unidos.
É preciso limpar os veículos
Os problemas que existem hoje não surgiram por acaso, disse Lee Schipper, da Embarq, instituto sediado nos Estados Unidos que presta consultorias para encontrar soluções de transporte urbano. Eles foram permitidos e até mesmo encorajados, devido a interesses comerciais e políticos, além de maus parâmetros ambientais. A proliferação de pequenos coletivos como as peruas são um problema sério, pois acabam por dividir o trânsito (e a emissão de poluentes) em veículos menores e mais “sujos”. A primeira medida, portanto, é limpar os veículos — tanto em termos de regulagem e tecnologia como do combustível utilizado.
Na maior parte dos Estados Unidos reina o transporte individual. Por isso, a visão norte-americana para melhorar os efeitos deletérios da poluição por veículos reside na tecnologia, no uso de combustíveis não derivados do petróleo e no estabelecimento de normas restritivas a emissões. Foi esse o teor da fala de Alan Lloyd, da Agência de Proteção ao Meio Ambiente da Califórnia. Idéias de desenvolver transporte coletivo existem, mas com menos ênfase.
Luis Cifuentes, da Pontifícia Universidad Católica do Chile, mostrou a experiência chilena em Santiago, onde a renovação da frota de ônibus e táxis teve grande impacto em reduzir as emissões de gases tóxicos. Mas ônibus movidos a combustíveis mais limpos, como gás natural ou biodiesel, não resolvem o problema de poluição se estão presos no trânsito, afirma Schipper. “A mobilidade sustentável é o que resolve o problema”. Segundo ele, a ênfase em combustíveis limpos traz o problema de aumentar sua demanda. A solução é reduzir a necessidade de combustível, explicou. Ruy de Góes, do Ministério do Meio Ambiente, argumentou que a longo prazo é importante reformular o transporte público. Mas a curtíssimo prazo é urgente atender à questão de saúde pública. Para isto, alternativas mais limpas como gás natural e biocombustíveis são necessárias.
Prioridade ao transporte público
Mas combustíveis limpos são uma pequena parte do pacote total, afirmou Lloyd Wright, da Fundação Viva, em Quito (Equador). “A sustentabilidade completa está longe de ser encontrada em um laboratório ou veículo ‘flex’”, alertou. Ele acredita que vias para pedestres, ciclovias e transporte público são soluções muito mais efetivas do que depender de um tipo de combustível. Mas ele avisa que essas soluções só serão adotadas pelo público se oferecerem velocidade, comodidade e segurança.
Em termos de transporte público, metrô pode ser preferível mas inviável. Experiências de sucesso, como Curitiba, Bogotá e Cidade do México, mostram que corredores rápidos de ônibus podem ser soluções eficientes e muito mais baratas do que o metrô. Um projeto em análise em Curitiba é o metrô cutting cover, explicou o Diretor de Negócios da Urbanização de Curitiba S.A. (Urbs) Clodualdo Pinheiro Júnior. É uma tecnologia mais barata do que o metrô convencional, porque as escavações se limitam a 7 metros de profundidade. Em cima dessa vala é posta uma tampa, sobre a qual se propõe a instalação de jardins e ciclovias.
Mas para realmente solucionar o problema, é preciso ousar. Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, contou sobre as mudanças feitas na capital colombiana. Segundo ele, a questão do transporte transcende questões científicas e técnicas. “As cidades têm que refletir que os seres humanos são sagrados”, diz. Elas têm que ser planejadas para promover igualdade social e bem-estar. Até agora foi dada prioridade à mobilidade dos carros mais do que à felicidade das crianças. E segundo ele, para sermos felizes precisamos caminhar. De outra forma sobrevivemos, como um passarinho sobrevive numa gaiola.
Peñalosa chega a considerações mais filosóficas do que políticas. Segundo ele, precisamos rever nossos ideais de felicidade. Talvez ter um carro possante e andar a 200 Km/h numa auto-estrada não traga tanta felicidade quanto passear numa bicicleta velha por uma ciclovia às margens de um rio. Acima de tudo, ele defende que as cidades devem contribuir para a igualdade de qualidade de vida entre as pessoas. Para o ex-prefeito, é impossível tomar decisões sobre transporte sem definir que tipo de cidade se quer. Sua proposta é construir cidades para as pessoas, que privilegiem o espaço público para pedestres.
É esse o rumo que ele tomou durante sua gestão de Bogotá: tornar a cidade mais agradável para pessoas do que para carros. Por isso, vagas para estacionamento perderam espaço para calçadas alargadas. Se os recursos são escassos, a prioridade vai para calçamento de vias para pedestres e bicicletas; se falta espaço, o que não cabe são os carros. É esta a visão de Peñalosa. E andar de bicicleta, não porque seja simpático ou divertido. Mas porque é um direito do cidadão deslocar-se de forma barata sem correr risco de vida.
Tais decisões exigem não só vontade, mas punho político. Porque as medidas para estimular o uso de transporte público não são necessariamente populares — como foi o caso do rodízio de carros na cidade de São Paulo, como lembrou o autor da medida Fábio Feldmann, atualmente Secretário Executivo do Fórum Paulista de Mudanças Climáticas. Peñalosa explica que em cidades onde os cidadãos utilizam transportes públicos, eles não o fazem por amor ao meio ambiente — mas porque há restrições sérias ao uso de veículos particulares.
Esforço conjunto
A conjunção de diversos setores propiciou uma possibilidade de estabelecer colaborações reais. Sigfried Rupprecht, da Iniciativa Civitas da Europa, se declarou aberto para troca internacional de lições práticas. Tanto a Europa como a América Latina têm experiências de sucesso que podem ser bem utilizadas em outros continentes.
O grande problema em São Paulo, segundo o Secretário Municipal de Transportes, é a fiscalização. “Planos temos, mas a realidade nos passa por cima”, lamentou.Vontade política foi a necessidade mais invocada pelos palestrantes da conferência. John Gummer, Secretário do Meio Ambiente do governo de Londres, afirmou: “É possível mudar a vida de uma cidade. Muitas pessoas devem suas vidas a políticas de qualidade do ar. Demos ouvidos por tempo demais àqueles que pensavam que seria difícil demais fazer algo. Poderíamos ter salvo muito mais vidas”.
Na sessão de encerramento, foi lida e discutida a “Declaração de São Paulo”, que estará disponível para sugestões no site da IAL nos próximos dez dias. Após esse período será redigida a versão final do documento, que segundo Sérgio Sánchez será o marco estratégico que constituirá o principal objeto de trabalho da Iniciativa. Eduardo Jorge conclamou as cidades latino-americanas a se filiarem para participar do processo de construção coletiva de políticas.
3 comentários:
Oi, Maria!
Falando em carros e poluição, não posso deixar de tocar em um assunto de extrema importância e que raras vezes é citado: os pneus!
A qualidade dos pneus de toda a frota brasileira, quando comparada aos países de primeiro mundo, é inferior; pois compramos um produto de qualidade inferior (já reciclado) do exterior. E o que acontece? O destino desses pneus é o lixo, pois eles não vão poder ser mais reciclados, ou seja, nós estamos fazendo as vezes do "lixão de pneus" dos países de industrializados!
Acredito que a política de importação de tais produtos deva ser revista, com urgência e, mais do que tudo, a mentalidade dos empresários precisa mudar. Além, é claro, de uma forte conscientização da população sobre o fato.
nossa, não sabia disso! estou precisando trocar os pneus do meu carro, como a gente sabe qual é a origem dos pneus?
Oi, Maria!
Pode trocá-los sem maiores cuidados...todos os pneus comercializados por aqui, pelas declarações que ouvi, da Ministra do Meio-Ambiente, têm a mesma origem que eu citei acima. :_(((
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